quarta-feira, 29 de abril de 2015

Devaneios Adolescentes


Quem será aquele rapaz que me encara até eu ficar sem graça? O olhar dele penetra a minha alma, fazendo-me sentir como se ele estivesse lendo os meus pensamentos mais íntimos... Tenho a sensação de que ele olha tão no fundo dentro de mim que consegue ver minha alma.

Às vezes eu acho que se ele olha assim pra mim é porque está interessado... Mas aí eu penso: "Por que cargas d'água um cara tão gato, que poderia ter qualquer menina da escola, iria se interessar justamente pela 'Betty, A Feia' aqui?" Então na verdade acho que ele me acha tão feia e estranha que simplesmente não consegue desviar os olhos de mim. 

Deve pensar: "Nossa, coitada.. Será que ela sabe o quanto é feia?" Sim, eu sei, o espelho faz questão de me lembrar disso sempre que o encontro. E além dele ainda tenho o lembrete constante dos "popularezinhos" da escola. Inclusive um dia desses alguém interrompeu meus devaneios enquanto eu o admirava, só para dizer "Volta pra realidade, Alice, por que nem em sonho você terá chances com ele!"

Bom, na vida real eu concordo: ele é muita areia pro meu caminhãozinho. Mas em meus sonhos, nós temos muitas chances de ficarmos juntos. Todas as chances do universo! Alias, já estamos super juntos, até: caminhamos de mãos dadas na beira da praia, assistimos o pôr-do-sol abraçadinhos, assisto filmes deitada no colo dele e adormeço com ele mexendo nos meus cabelos... Já estamos até escolhendo nomes pros nossos cachorros - teremos 2 no mínimo! - e dos nossos filhos - pensei em Matheus e Mirela, se tivermos um casal e ele concordou, contanto que sejam vascaínos. 

Tem horas que eu penso: e se ele fosse realmente capaz de ler minha mente todas as vezes que me encarasse? Será que ia me achar retardada como eu me acho quando me pego "viajando na maionese" desse jeito? Ou será que por um milagre incrível ele iria gostar e acabaria embarcando na minha viagem? Sei lá, né... Vai que, contrariando todas as estatísticas, do mesmo jeito que eu estou na dele ele está na minha? Não sei e acho que nunca vou saber, porque hoje é o último dia de aula  e  se ele passar no vestibular, nós nunca mais vamos nos ver...   


domingo, 26 de abril de 2015

Querido alguém...

Nova carta à mais um "Querido Alguém"...




Diferenças


Amanda acorda todos os dias pouco antes do despertador tocar, às 5 horas, e por mais que queira dormir mais um pouco, sabe que preguiça não tem hora marcada em sua agenda lotada de responsabilidades e compromissos. Ela começa seu dia com uma corrida pelas ruas do bairro antes mesmo do sol acordar para, segundo ela, “acordar e preparar o organismo para enfrentar o estresse do dia-a-dia”. Seu cachorro Brownie lhe faz companhia pelas vias adormecidas e escuras. Ao retornar, cronometradamente uma hora depois, toma um banho demorado e revigorante e enquanto se arruma para sair novamente é a única hora do dia que tem tempo para ver TV durante a semana. Na verdade, “ver a TV” é o que ela menos faz; ela “ouve” o noticiário da manhã. Depois sai para enfrentar sua longa jornada diária.

Enquanto isso, do outro lado da cidade, Taylor chega em casa aos tropeços de tão bêbado após mais uma noite de curtição com seus amigos. Dessa vez foi à festa de inauguração de mais um estabelecimento pertencente ao grupo de entretenimento do qual é sócio majoritário, uma boate que promete ser a mais moderna e requintada casa noturna da cidade. Ele é praticamente carregado por sua bela e alterada acompanhante ajudada por seu melhor amigo, que está num estado um pouco melhor do que o dos outros dois. “A festa pode ter acabado, mas a noite ainda não!” ele exclama, erguendo um champanhe e botando o som no máximo dando continuidade a festa em seu próprio apartamento, sem se importar se o barulho irá incomodar os vizinhos ou não. Sua bateria só acaba quando a noite já virou dia. Seus olhos azuis só se fecham quando a lua já trocou de turno do com o sol.

A jornada diária de Amanda até a loja onde trabalha como gerente de setor é longo. A loja fica num dos bairros da região central da cidade, cerca de uma hora e meia de distância do bairro de classe média baixa onde ela mora e por depender do transporte público, o tempo de deslocamento até lá chega a aumentar quase uma hora nos horários de pico. Então para evitar isso, ela prefere sair bem mais cedo do que a maioria dos seus vizinhos que fazem trajetos semelhantes saem. A primeira etapa do caminho é feita no único ônibus do bairro que a leva até a estação de metrô mais próxima, para de lá ela pegar o trem e continuar seu percurso até o trabalho. Ela gosta de sentar nas cadeiras mais altas do ônibus para “ver a cidade de cima” e sempre chega no metrô com minutos de crédito para comprar um cafezinho pra viagem e um jornal na revistaria onde é “freguesa vip”. O percurso final, feito de metrô, ela faz lendo as matérias de maior destaque do jornal enquanto bebe seu café distraidamente, ignorando totalmente os cadernos de “Entretenimento”, “Programação da TV” e “Coluna Social”.

Taylor acorda com seu celular tocando insistentemente. A vontade que tem é de arremessá-lo na parede, mas ao ver sua foto ao lado de uma loira estonteante aparecer na tela ele resolve atender. Era a gata que descolara na noite anterior cujo nome não lhe vinha a cabeça, lhe perguntando se havia esquecido o sutiã em sua casa. Ele dá uma olhada rápida em volta e se surpreende com duas mulheres seminuas totalmente desconhecidas dormindo a seu lado. “É... A noite rendeu!” ele se gaba, achando o sutiã da loira num canto do quarto, tal como outras peças de roupas e acessórios espalhados pelo cômodo. Agora que já acordou, resolve começar seu dia com um mergulho na piscina de sua luxuosa cobertura de frente pro Central Park, para “acordar e ter a dose diária de exercício físico”, como costuma dizer, acordando as duas garotas despidas em sua cama com o barulho da água. Elas se juntam a ele no mergulho, todos “do jeito como vieram ao mundo”, depois tomam um banho demorado e quente na hidromassagem de sua suíte. Ao saírem do quarto todos devidamente vestidos, ele em sua roupa de grife, elas nos trajes vulgares que foram para a boate na noite anterior, dão de cara com um verdadeiro banquete preparado pela empregada de Taylor, que o conhece desde bebê e cuida dele como se ele fosse seu próprio filho, depois saem da casa, Taylor as deixando na estação de metrô próxima e seguindo para o trabalho.

Apesar de ser a funcionária que mora mais longe, Amanda é a única que consegue chegar no trabalho todos os dias com tanta antecedência que consegue preparar o café da manhã para o resto da equipe, que muitas vezes vai trabalhar de estômago vazio, além de arrumar seu setor antes mesmo dos encarregados de serviços gerais chegarem. Sua pontualidade e assiduidade sempre lhe rendem elogios vindos tanto dos colegas de setor quanto dos outros departamentos e até de seus superiores. Ganhar destaque como “Funcionário do Mês” já é tão comum que o Gerente nem se dá mais ao trabalho de tirar sua foto da parede ao fundo do Caixa da loja. Quando a loja abre, às 8 horas em ponto, lá está ela imponente em seu posto na sessão de Perfumaria e Cosméticos, sempre bem maquiada e penteada e com seu sorriso simpático sempre estampado no rosto.

Além de ser sócio majoritário de uma das empresas de maior destaque no ramo do entretenimento e realização de eventos da cidade, Taylor é pupilo de seu pai na administração dos negócios da família, uma vez que um dia herdará sozinho todos os bens adquiridos desde a época de seu avô. Sua conta bancária já tem tantos zeros que se ele quiser parar de trabalhar agora, aos 27 anos e não trabalhar nunca mais na vida ele pode muito bem fazê-lo, o que o faz se sentir no direito de aparecer em seu escritório a hora que quiser, isso quando resolve aparecer. A verdade é que ele trabalha mais por hobby do que por necessidade, o que ele gosta mesmo é dos prestígios que seu nome e suas posses lhe dão, ele gosta é de se deleitar nos eventos aos quais é convidado e sentir seu ego inflar ao ver seu rosto estampado nas colunas sociais.

Passar 8 horas se equilibrando sobre um salto e mantendo o sorriso constantemente estampado no rosto não é para qualquer um, mas Amanda tira de letra. Ao fim da jornada de trabalho tudo o que ela mais quer é ir pra casa, mas não é isso que faz: ela sai do trabalho e vai direto para a faculdade, não muito longe dali. Conciliar trabalho e estudo, é algo que para muitos é impossível, mas para ela teve que se tornar possível por questão de necessidade, desde os seus 14 anos, quando resolveu ganhar o próprio dinheiro para desafogar seus pais da obrigação de cuidar de mais um filho além dos seus quatro irmãos mais novos. Seus pais nunca a obrigaram a isso, muito menos cobraram qualquer contribuição monetária dentro de casa apesar das dificuldades que a “do lar” e o “faz tudo” enfrentavam para criar os filhos, porém Amanda sempre se sentiu na obrigação de ajudar seus pais e irmãos. E foi com esse intuito que deixou eles e seus amigos na pequena Little Falls e veio para New York City realizar seu sonho de se tornar uma grande jornalista e poder dar a sua família melhores condições.

Depois de um dia de trabalho, Taylor sempre tem um plano pra relaxar e curar o estresse do dia, mesmo quando a coisa que menos fez durante o dia foi trabalhar e se estressar. Seja num bar ou numa festa, ele pode até chegar sozinho, mas jamais passa o resto da noite desacompanhado. Convites pra sair não lhe faltam e muito menos lhe falta vontade de recusá-los, portanto sua agenda está sempre cheia, de segunda a segunda, muitas vezes com mais de um lugar com sua presença confirmada, lhe obrigando a comparecer em mais de um evento social na mesma noite. Para Taylor, estar sempre cercado de gente, conhecida ou não, é muito mais relaxante do que uma sessão com sua massagista; a badalação recarrega sua energia mais do que uma noite de sono; a agitação noturna faz seu sangue fluir, faz seu coração bater, faz ele se sentir vivo.

“Diversão” é uma palavra quase desconhecida por Amanda. Não que ela não se divirta as vezes, mas é que é tão difícil arranjar um tempinho na sua agenda apertada e corrida, que ela simplesmente aprendeu a substituir essa palavra por outras como “estudar”, “ler”, “pesquisar” e “escrever”. Seus amigos do trabalho e da faculdade vivem insistindo para ela sair com eles pra tomar uma cervejinha ou dançar um pouco, mas esses convites não a atraem muito. No entanto, é a primeira na fila da pipoca quando recebe convites pro cinema ou pro teatro, suas duas paixões. Exposições de artes, feiras de artesanatos e antiguidades, livrarias e cafeterias também são ótimos pretextos para tirá-la de casa.

Como todo playboyzinho que se preze, Taylor gosta de se vestir bem e causar boa impressão. Está sempre bem vestido e cheiroso, atraindo olhares e arrancando suspiros de todas as mulheres pelas quais passa. Está sempre ligado nos novos lançamentos das maiores boutiques masculinas da cidade e sempre que uma nova abre, faz questão de ir conhecê-la e se tornar cliente fidelidade, não pelo desconto, pois não precisa disso, mas sim pela exclusividade em ver e poder comprar as peças das novas coleções. Como dinheiro não lhe é problema, fazer compras altas com freqüência é algo corriqueiro para Taylor.

Apesar de já morar numa grande cidade há alguns anos e trabalhar numa das maiores boutiques do país – se não do mundo! – Amanda ainda tem aquele mesmo ar interiorano e comum que tinha em Little Falls. Isso não quer dizer que ela seja descuidada ou não saiba se vestir bem, muito pelo contrário, está sempre impecavelmente bem vestida e maquiada, porém suas peças não são assinadas por estilistas famosos, tampouco são da última coleção. Gastar dinheiro com roupa é algo que Amanda só faz uma vez por ano e olhe lá, mesmo assim a única boutique em que entrou na vida foi na Ralph Lauren onde trabalha.

Mesmo sendo pessoas de culturas e hábitos tão diferentes, os caminhos de Taylor e Amanda um dia se cruzaram e o que parecia impossível de acontecer entre eles aconteceu: o riquinho badalador e mulherengo e a trabalhadora responsável e caseira se apaixonaram e entraram de cabeça nesse relacionamento inesperado e contraditório. O início foi turbulento pros dois, foi difícil conciliar tantas diferenças tão abismais, mas o mesmo destino que os aproximou fez todo o trabalho de os manter juntos.

Ela passou a sair mais, curtir um pouco mais a vida, a brindar a juventude; ele maneirou na curtição, diminuiu as bebedeiras e as baladas, aprendeu que também é possível se divertir dentro de casa. Ele passou a levar o trabalho mais a sério, se tornou mais responsável e adulto, nunca mais se atrasou ou saiu mais cedo; ela passou a chegar e sair no horário certo no trabalho, diminuiu a quantidade de horas-extras e descobriu que matar uma aula ou outra não fazia mal algum. Ela continuou fazendo sua corrida matinal e sua dieta rigorosa durante a semana, mas nos finais de semana se dava o direito de comer um Burguer King ou uma pizza bem gordurosa; ele se matriculou na academia, passou a seguir uma dieta feita por um nutricionista e trocou a Coca-Cola grande do café da manhã pelo suco de laranja natural feito na hora. Ele perdeu o contato com todas as outras mulheres que antes não paravam de procurá-lo e descobriu que seus amigos de farra só eram seus amigos mesmo quando ele os colocava dentro de uma balada; ela passou a ser odiada por essas mesmas mulheres e por esses mesmos amigos, porém juntos fizeram novos amigos muito mais interessantes e verdadeiros.

As pessoas que os conheceram antes deles se conhecerem e acompanharam a evolução do relacionamento desde o início, tiveram que admitir que ficaram surpresas quando receberam o convite do casamento, pois ninguém esperava que o namoro entre dois opostos daria tão certo. Se surpreenderam mais ainda um ano depois, com a notícia de que Taylor vendera sua parte na empresa de entretenimento para comprar e reformar o antigo jornal de Little Falls e dá-lo de presente de formatura para Amanda, no mesmo período em que comemoraram o aniversário de um ano de casamento.

Amanda, que não pretendia voltar a morar no interior, cedeu ao pedido dengoso do amado quando este pediu para que seus filhos fossem criados num lugar afastado da bagunça de New York City. Taylor, por sua vez, aceitou a condição da amada de voltar a morar em Little Falls desde que só tivessem no máximo três filhos ao invés dos sete que ele queria ter.

Hoje Amanda e Taylor vivem felizes em Little Falls, onde moram numa casa confortável e com um amplo jardim do jeito como Taylor sempre desejou ter quando criança, mas não teve porque sempre morou em apartamento. Seus três filhos, apesar de serem criados com regalias que Amanda não teve, aprenderam que nada na vida vem de “mão beijada” e que pra conseguirem o que querem eles têm que merecer e batalhar por isso, exatamente como seus avós maternos ensinaram a sua mãe desde novinha e seus avós paternos tentaram ensinar a seu pai por anos, sem sucesso.

Amanda e Taylor são a prova viva de que mesmo quando parece que o Cupido errou o alvo, na verdade ele o acertou em cheio, mas como gosta de travessuras, gosta de nos fazer de bobos um pouco; são a prova viva de que os opostos se atraem, de que mesmo onde parece só haver diferença, é possível encontrar semelhanças, basta a gente dar uma chance a emoção ao invés de só dar ouvidos a razão.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Querido alguém...


Sempre tive uma certa dificuldade de verbalizar meus sentimentos e pensamentos, então há alguns anos venho escrevendo cartas onde expresso amor, ódio, perdão, revolta, gratidão e outros sentimentos.
No link abaixo você encontra a primeira delas a ser digitalizada e publicada

 Querido alguém que se acha

terça-feira, 21 de abril de 2015

Se você ainda estivesse aqui...



Já se passaram tantos anos desde que você se foi, mas a sua ausência ainda é sentida.
Confesso que já não me pergunto mais com tanta frequencia como seria a vida se você estivesse aqui ainda, mas não consigo parar de pensar que seria muito melhor.

Se você ainda estivesse aqui, eu ainda teria meu escudo protetor, mesmo que entre a gente ainda rolassem aquelas brigas sem pé nem cabeça que ninguem nunca lembra como começaram.

Se você ainda estivesse aqui, eu ainda teria meu conselheiro, teria alguém para me ajudar a entender melhor a cabeça dos homens.

Se você ainda estivesse aqui, eu ainda teria um segundo pai para suprir todas as necessidades que o primeiro não conseguiu suprir.

Se você ainda estivesse aqui, eu teria meu melhor amigo ao meu lado 24 horas por dia, 7 dias por semana.

Se você ainda estivesse aqui, eu teria um professor particular em tempo integral para me ensinar tanto as materias escolares quanto para me ensinar sobre a vida.

Se você ainda estivesse aqui, eu teria um abrigo para me acolher todas as vezes que eu brigasse com nosso pai ou simplesmente quisesse dormir aí pra matar saudades.

Se você ainda estivesse aqui, nossa família seria de 4, depois 5, 6, 7... A casa estaria sempre cheia como eu sempre quis que estivesse.

Se você ainda estivesse aqui, eu teria uma nora-irmã com a qual compartilharia seus momentos e fotos vergonhosos, com apoio total da nossa mãe, é claro,

Se você ainda estivesse aqui, eu teria sobrinhos e nossos pais teriam netos que encheriam nossa casa de vida e alegria.

Se você ainda estivesse aqui, nossos pais estariam bem e felizes sempre. Estariam completos tambem...

Se você ainda estivesse aqui, eu tambem estaria bem, feliz e completa.

Se você ainda estivesse aqui, nossa família estaria bem, feliz e completa.

E talvez teriamos um ou mais cachorros, hamsters, passarinhos... o zoológico inteiro, tudo graças a união de nossa força fraternal.

Filha do coração


Fui adotada logo que nasci e nunca tive qualquer contato com minha família biológica, nem nunca tive interesse em procurar saber porque pra mim, família é a que cria, educa e dá amor incondicional, coisas que eu tenho, sempre tive e sempre terei na minha família e não abro mão.

Quando eu descobri que ser "filha do coração" significava "não ter nascido da barriga da minha mãe" eu fiquei muito chateada, sim, mas meus pais sempre trabalharam muito comigo essa questão, em especial a minha mãe que sempre teve uma "coisa" comigo muito grande! Um grude mesmo, uma superproteção, um amor imensurável!

Ela perdeu dois filhos biológicos, sendo um deles uma menina, então ela sempre me dizia que "Papai do Céu levou um anjinho porque era hora de outro vir à Terra" e por muitos anos eu não entedia porque Papai do Céu quis fazer uma coisa dessas (levar os meus irmãos e me tirar dos meus pais biológicos), mas hoje eu entendo perfeitamente: meus irmãos, filhos biológicos dos meus pais adotivos, nasceram com problemas de saúde crônicos e provavelmente se estivessem vivos hoje, ainda os teriam, o que os incapacitariam de cuidar da nossa mãe que hoje é portadora da Doença de Huntington, uma doença degenerativa incurável e progressiva, e por isso depende 100% de mim, sua única filha adotiva e saudável, para cuidar dela do mesmo jeito que ela cuidou de mim enquanto pôde fazê-lo.

Sinto muito orgulho da minha história e tenho prazer em compartilhá-la. Acho que tudo nessa vida tem um motivo pra acontecer, mesmo que a princípio não consigamos entender ou aceitar. Às vezes eu paro e penso: "E se eu não tivesse sido adotada, o que seria de mim hoje?" ou "E se meus irmãos estivessem vivos, eu teria sido adotada do mesmo jeito?" São perguntas que nunca terão uma resposta concreta, mas eu criei minhas próprias respostas: Se eu não tivesse sido adotada, talvez nem estivesse viva hoje ou mesmo se estivesse, sabe-se-lá que tipo de vida estaria levando, então tenho mais é que agradecer por essa bênção que Deus me deu que é ter encontrado uma família aberta pra me receber e me amar, independente se o sangue que corre em minhas veias é igual ou não ao deles; o que importa é que o sentimento que nos une é o mesmo: o AMOR.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Prisioneira de Mim Mesma


No início eram só alguns movimentos quase imperceptíveis: uma piscada dessincronizada, uma franzida de testa, uma repuxada de lábio que eu sequer notava que estava fazendo. Vez ou outra eu era perguntada "por que tá fazendo essa cara?" e minha resposta era outra pergunta "Que cara?" aí descreviam o que eu supostamente havia feito com os olhos ou com os lábios, mas como eu sabia que não havia feito nada disso, eu só achava que "Fulano endoidou.." e deixava pra lá. A medida que situações como essas se tornaram mais frequentes então começarem a acreditar e a falar que eu havia desenvolvido tiques nervosos.

De repente esses tiques nervosos não se limitavam mais a curtas alterações de expressões faciais, passaram a ocorrer por todo o meu corpo com cada vez mais frequência e a intensidade aumentou tanto que até eu me incomodava comigo mesma. Eu tentava pará-los mantendo minhas pernas bem cruzadas e minhas mãos entrelaçadas e isso até funcionou por um curto período de tempo, mas logo percebi que realizar tarefas tão banais quanto comer e falar se tornaram difíceis.

Meu andar também se alterou. Eu tropecei, cai e me machuquei por tantas vezes, em casa ou na rua, que acharam melhor me tirarem meus tão amados sapatos de salto. Certa vez um vizinho muito gentil me parou na rua enquanto eu voltava da padaria e me ofereceu para segurar meu braço para auxiliar na caminhada... No dia seguinte soube que esse mesmo vizinho gentil havia espalhado para todos do prédio que eu estava tão bêbada que não conseguia andar sozinha! Daquele dia em diante achei melhor não sair mais de casa sozinha, muito menos se tivesse que caminhar, porque sentia que minhas pernas não me obedeciam mais. Eu estava perdendo o controle de mim mesma.

Cada limitação nova que aparecia me tirava um pouco da vontade de viver, eu me fazia sentir por diversas vezes vontade de me trancar no quarto e ficar encima da cama esperando a morte vir me buscar. As pessoas vinham falar comigo sobre ter esperança e fé, mas a única coisa que eu me perguntava era "Queria ver se elas estariam falando isso se estivessem no meu lugar". O pior é que nem fazer essa pergunta a eles eu podia porque ninguém me entendia com clareza mais, então, para evitar a frustração de me repetir mil e uma vezes e não me fazer entender, aos poucos fui falando cada vez menos, até que uma hora minha voz parou de sair.

As vezes eu penso que talvez se eu tivesse continuado a falar, mesmo sem ser entendida, talvez hoje eu conseguisse emitir algum som, pelo menos pra demonstrar minha insatisfação quando passam o perfume que não quero passar ou mostrar o quanto fico feliz quando como uma picanha bem passada. Mas infelizmente não posso mais manifestar minhas emoções através da fala... A não ser sono que sempre me faz emitir bocejos tão altos que surpreendem a todos, até a mim mesma.

Sabe o que é o mais triste de tudo isso? É ver como as pessoas tem uma visão distorcida da situação. Elas acham que o fato de eu não falar, nem manifestar mais minhas emoções como antigamente quer dizer que eu não sinta nada, mas estão absurdamente equivocadas! Eu sinto absolutamente TUDO! E se você prestar bem atenção, verá que estou demonstrando meus sentimentos muito sutilmente, só não faço isso com a mesma agilidade de antes. Ou você acredita mesmo que eu gosto do sabor horrível dos remédios que tenho que tomar? Claro que não! Embora eu não demonstre, me sinto muito aliviada quando sinto o gosto maravilhoso do suco que me dão logo em seguida para tirar o gosto ruim.

Também me sinto muito feliz quando recebo visitas, mesmo das pessoas que gritam como se eu fosse surda ou falam em câmera lenta como se eu fosse retardada. Eu sei que não fazem por mal, fazem por puro desconhecimento da doença, mas confesso que isso me irrita bastante, tanto quanto quase grudar a cara na minha por achar que sou cega! Não, pessoal, não sou surda, nem cega, nem retardada, eu só não falo, mas ouço, vejo, entendo, sinto e penso.

Ao mesmo tempo que é um saco ter todo mundo fazendo tudo por mim, muitas vezes inclusive fazendo coisas que eu não quero ou não gosto, é bem cômodo não ter mais que enfrentar o estresse do transito, nem a fila do supermercado. Os olhares que a cadeira de rodas geralmente atraem ainda me incomodam muito também, mas dou graças a Deus por ela todos os dias quando sinto a brisa do mar tocar meu rosto. Também acho bem frustrante quando as pessoas não conseguem entender o que eu quero (ou não quero), mas o esforço delas em me agradar é tanto que só me faz pensar em uma coisa: o quanto é grande o amor delas por mim!

Em resumo, não sou mais a mesma fisicamente falando, mas sou a mesma mentalmente. É como se eu estivesse presa dentro do meu corpo. Meus olhos veem, meus ouvidos ouvem, minha mente pensa, mas meu corpo só reage quando e como quer; ele e minha mente estão divorciados, por assim dizer. As vezes sinto como Rapunzel: meu corpo é a torre onde estou presa, minha doença é a bruxa que me prendeu, meus remédios, assim como a trança, me trazem pro mundo real e as pessoas que me amam são o príncipe que vai me resgatar.


Término


Queria que nosso namoro
Nunca tivesse chegado ao fim
Queria ter a certeza
De que você ainda gosta de mim

Você pra mim
Foi mais que um namorado
Foi um super-amigo
Que sempre esteve ao meu lado

Os momentos que passamos juntos
São dificiceis de esquecer
Já que tudo nesse mundo
Faz-me lembrar você

Minha vida sem você
Não faz nenhum sentido
Será que não poderíamos
Ao menos sermos amigos?

Te Espero


No meu coração algo me diz
Que ao seu lado um dia serei feliz

Não sei se esse dia demorará a chegar
Só sei que valerá a pena por ti esperar

Mesmo que a espera seja longa e me faça sofrer
Não me importo pois amo muito você

Lobo Solitário

Gosto de sair andando para qualquer lugar
Sigo qualquer rumo sem saber onde vou chegar
Não sou daqui, muito menos de lá
Não sou de lugar nenhum, vivo em qualquer lugar
Viajo todo o mundo em busca da liberdade
Tanto faz se está no campo ou na cidade
Em mim ninguém manda, a mim ninguem prende
Nunca precisei de ninguem, sem pre fui independente
Não me prendo a bens nem ao amor
Prefiro seguir sozinho assim evito a dor

sexta-feira, 17 de abril de 2015

O que você vê da sua janela? (II)


Da minha janela vejo o meninos com bola
Vejo a menina com boneca
Vejo os dois na escola

Da minha janela vejo uma família sentar para jantar
Vejo pais e filhos conversarem
Vejo o lar se alegrar

Da minha janela vejo laços se estreitarem
Vejo corações perdoando
Vejo feridas sararem

Da minha janela vejo pássaros cantores
Vejo um horizonte verde
Vejo a arte divina e suas várias cores

Da minha janela vejo crianças brincando descalças na lama
Vejo a vida real sair do mundo virtual
Vejo cimento virar grama

Da minha janela vejo o céu azul se refletir no mar
Vejo a um jardim florecer
Vejo a natureza a se regenerar

Da minha janela vejo gregos e troianos virarem amigos
Vejo paz em tempos de guerra
Vejo aperto de mão entre antigos inimigos

Da minha janela vejo o cego enxergar
Vejo o mudo cantar ópera
Vejo o cadeirante caminhar

Da minha janela vejo a chegada de um bebê
Vejo o pulso voltar a pulsar
Vejo o velho rejuvenescer

Da minha janela vejo semente feia virar uma bela flor
Vejo o galho mais fino tocar o céu
Vejo fruto pequeno dar mais sabor

Da minha janela vejo a bondade numa ação
Vejo a esperança de um olhar
Alimentar a fé de um coração

O que você vê da sua janela? (I)


Da minha janela vejo crianças que não sabem mais brincar;
Vejo infâncias perdidas
Vejo adolescências destruídas

Da minha janela vejo pais ausentes
Vejo filhos perdidos
Vejo drogas presentes

Da minha janela vejo o carinho que não foi dado
Vejo o abraço negado
Vejo o "Eu te amo" que não foi falado

Da minha janela vejo a máquina chegar;
Vejo a floresta cair
Vejo o rio secar

Da minha janela vejo árvore virar prédio
Vejo conversa virar texto
Vejo o contato humano virar tédio

Da minha janela vejo pernas virarem rodas
Vejo cabeças virarem caixas
Vejo sapatos finos tomarem o lugar das brutas botas

Da minha janela vejo a honestidade desaparecer
Vejo a criminalidade ser algo normal
Vejo a maldade vencer

Da minha janela vejo a dor sentida
Vejo o grito sufocado
Vejo a lágrima escorrida

Da minha janela vejo a veia entupir
Vejo o coração parar
Vejo a vida se esvair

Da minha janela vejo faces distorcidas
Vejo corpos mutilados
Vejo identidades perdidas

Da minha janela vejo o mundo se perder
Vejo tudo se transformar
Vejo mudanças que não quero ver.

Só por hoje

Só por hoje vou relaxar
Só por hoje não vou me estressar

Só por hoje vou ler um livro por puro prazer
Só por hoje vou me ocupar de nada pra fazer

Só por hoje vou deixar o celular desligado
Só por hoje o Facebook ficará desatualizado

Só por hoje vou andar descalça
Só por hoje a roupa social vai dar lugar ao moletom e calça

Só por hoje minhas unhas vão ficar por fazer
Só por hoje vou fazer tudo sem correr

Só por hoje não vou me importar com a pressão alta
Só por hoje a salada será substituída por uma torta

Só por hoje ao invés de café vou tomar chá
Só por hoje o suco vai virar Guaraná

Só por hoje a cama ficar desarrumada
Só por hoje a roupa não será lavada

Só por hoje não me maquiarei
Só por hoje meu cabelo não alisarei

Só por hoje vou tirar folga da realidade
Só por hoje vou ser eu de verdade